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Ong ambientalista é denunciada por grilagem de terras no Pantanal

Ecotrópica teria "engolido" cerca de 5 mil hectares da União e de um fazendeiro para obtenção de títulos ambientais, vendidos a R$ 2 mil por hectare

20 janeiro 2025 - 13h30Neri Kaspary, Correio do Estado

Denúncia protocolada em dezembro do ano passado no Ministério Público Federal (MPF) e no Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul (MPE-MS) aponta a existência de um suposto esquema de grilagem de terras públicas e privadas no Pantanal feita por uma ong ambientalista que estaria usando estes documentos para obter faturamentos milionários com a venda dos chamados Títulos de Cota de Reserva Ambiental. 

O autor da denúncia é o empresário e proprietário rural Bruno Teixeira Canabrava, sócio da empresa paulista Miller Foods Distribuição e Importação de Alimentos e proprietário da Fazenda São Gonçalo do Amolar, um imóvel a mais de 150 quilômetros ao norte de Corumbá, na região da Serra do Amolar. 

De acordo com esta denúncia, a ong Econtrópica (Fundação de Apoio à Vida nos Trópicos), que tem sede em Mato Grosso mas que em Mato Grosso do Sul é gerida pelo ex-policial militar Angelo Rabelo, “engoliu” em torno de 5 mil hectares de terras privadas e da União para serem incorporadas pelas fazendas Penha e Acurizal, pertencentes à Ecotrópica.

Segundo o ambientalista e advogado Nelson Araújo Filho, que assina o documento encaminhado ao Ministério Público, nesta nova forma de grilagem de terras não existem cercas nem ocupação das áreas. 

Ela consiste, segundo o advogado, na obtenção de documentos de georeferenciamento emitidos pelo Incra e depois na obtenção de títulos ambientais, que são emitidos pelo Imasul. Estes títulos, por sua vez, são vendidos para produtores rurais de outras regiões do país. 

Produtores que desmataram acima do permitido “compram” reservas ambientais no Pantanal, por exemplo, e com isso ficam livres da obrigação de reflorestarem suas terras. A proposta, segundo Nelson Araújo, é fantástica, uma vez que garante a preservação do Pantanal. Porém, diz ele, tem gente se aproveitando disso para “ganhar muito dinheiro”.

De acordo com o advogado, a Ecotrópica estaria vendendo estes títulos por cerca de R$ 2 mil por hectare. Então, acredita ele, somente com a grilagem dos cinco mil hectares que ele acredita ter descoberto naquela região da Serra do Amolar a ong pode ter faturado cerca de R$ 10 milhões ilegalmente na venda dos títulos de terras que não lhe pertencem. 

Naquela região do Pantanal a Ecotrópica é proprietária de cerca de 27 mil hectares, segundo o advogado. Porém, nem tudo é passível de venda de títulos ambientais, uma vez que em áreas alagáveis não se consegue a emissão destes títulos. 

Ainda de acordo com o advogado, a Ecotrópica, ou o presidente do Instituto Homem Pantaneiro (IHP), Angelo Rabelo, estaria vendendo estes títulos pela metade daquilo que realmente valem, prejudicando outros proprietários de imóveis da região que também preservam suas fazendas no Pantanal. E é exatamente por conta disso que o fazendeiro Bruno Canabrava está fazendo a denúncia.

Rabelo estaria fazendo isso, explica Nelson Araújo, porque as terras não lhe pertencem e ele nunca fez investimento para ter a posse das áreas, ao contrário dos fazendeiros que compraram e fazem a manutenção das fazendas da região. Então, como nunca teve custos, vende os títulos por valores abaixo do mercado.

INCRA E IMSAUL

As denúncias protocoladas no MPE e no MPF, acompanhadas de pedidos de explicações, também foram encaminhadas ao Incra e ao Imasul, que, respectivamente, emitem as certidões de georefenciamento e os títulos. Sem estes dois órgãos públicos, diz Nelson Araújo, o negócio não seria possível. 

A suspeita é de que haja algum tipo de conivência nestas instituições, uma vez que o Incra tem todos os registros de terras públicas e privadas do Pantanal e não iria cometer erros grosseiros como os que aconteceram neste caso, diz o advogado. 

Indagado se grilagem parecida pode estar ocorrendo em outras regiões do Pantanal, Nelson Araújo não quis ser taxativo. Porém, não descartou a possibilidade de estes 5 mil hectares que ele diz ter descoberto serem apenas a ponta de um grande iceberg.

O Instituto do Homem Pantaneiro (IHP) é um dos principais controladores de uma espécie de corredor ecológico com cerca de 530 mil hectares no Pantanal. Boa parte das terras pertencem a Teresa Bracher, esposa de Candido Bracher, acionista e ex-presidente do Itaú. Outro investidor é o banqueiro André Esteves, fundador do BTG Pactual.

Outro bilionário (ou ex-bilionário) que investiu pesado na não região é Elizer Batista, que doou cerca de 13 mil hectares ao Instituto do Homem Pantaneiro. 

Ícone da defesa do Pantanal

A denúncia sobre o suposto esquema de grilagem de terras e venda de títulos ambientais foi protocolada no dia 20 de dezembro. Cinco dias antes, em 15 de dezembro, Angelo Rabelo, que é principal alvo das denúncias, recebeu homenagem no programa Melhores do Ano de 2024, exibido pela TV Globo, durante o programa Domingão do Huck.

Ele apareceu ao vivo, em rede nacional, na premiação que foi direcionada para pessoas que ajudaram a inspirar ações positivas e de superação no Brasil. O Pantanal foi um dos temas centrais nas homenagens feitas pelo programa, que também reconheceu os melhores da TV no ano. 

Além do Pantanal e Angelo Rabelo, houve homenagem para ações desenvolvidas no Rio Grande do Sul, por conta do impacto das enchentes, e dos impactos da violência no Rio de Janeiro.

Coronel aposentado da PM, Angelo Rabelo diz estar há mais de 40 anos em atuação direta para conservar o Pantanal. Em seu discurso de agradecimento, 

que durou 2 minutos, destacou a necessidade de as pessoas valorizarem as origens, principalmente para terem atenção com a proteção da natureza.

Ele também citou o trabalho fundamental da equipe do Instituto Homem Pantaneiro (IHP), que ele fundou em 2002, bem como o apoio do Prevfogo/Ibama e o Corpo de Bombeiros para prevenir e combater os incêndios florestais.

“A grande maioria das pessoas tem compromisso com si mesmo, o compromisso coletivo é um desafio que todos deveríamos assumir, porque devemos de fato caminhar para proteger. Manoel de Barros nos disse que somos todos devedores dessas águas, e nós somos devedores dessas águas”, afirmou em seu discurso em rede nacional.

A entrega do prêmio foi feita pelo jornalista William Bonner, que fez o anúncio sobre a homenagem e ressaltou os danos que as mudanças climáticas estão causando no Pantanal, com estiagem grave e incêndios florestais intensos.  Em 2024, o fogo queimou mais de 17% do território.

No primeiro semestre, Rabelo foi para Nova Iorque (EUA) para o evento anual do The Explorers Club, que reúne mais de 3,6 mil pessoas de referência global para transformar positivamente o mundo. Ele foi indicado como uma das 50 pessoas no mundo a atuar para transformações positivas, no The Explorers 50.

A reportagem do Correio do Estado procurou a assessoria do Instituto do Homem Pantaneiro na última sexta-feira, 17. Porém, até a manhã desta segunda-feira, 20, não havia obtido retorno. 

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