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Mais de 60 filhotes órfãos estão sob cuidados intensivos no hospital veterinário

03 outubro 2024 - 10h35Gustavo Escobar, Imasul

No coração de Mato Grosso do Sul, o Imasul, através do CRAS (Centro de Reabilitação de Animais Silvestres) e do Hospital Ayty, se tornou um verdadeiro refúgio para filhotes órfãos e feridos, oferecendo a eles uma nova chance de sobreviver.

Atualmente, mais de 60 filhotes estão sob cuidados intensivos, resgatados de tragédias como o tráfico de animais, apreensões realizadas pela Polícia Militar Ambiental, Grupo de Resgate Técnico Animal Cerrado Pantanal (Gretap) e o Ibama, e, em muitos casos, vítimas das queimadas devastadoras que destroem seus habitats.

Cada filhote que chega ao CRAS carrega consigo uma história de superação. Ao atravessarem os portões do Hospital Ayty, são imediatamente recebidos por uma equipe comprometida de biólogos, veterinários e zootecnistas, que, com atenção e precisão, os conduzem ao ambulatório.

Nesse espaço, suas condições de saúde são avaliadas de forma minuciosa, e o processo de reabilitação começa, marcado pela esperança de devolver esses animais à vida que foi cruelmente interrompida.

O setor de filhotes é o local onde essa jornada de recuperação realmente começa. Mamíferos recém-nascidos, muitas vezes órfãos ou gravemente feridos por incêndios, chegam completamente dependentes do cuidado humano. Alimentados com mamadeiras, esses pequenos precisam de semanas de atenção ininterrupta, até que possam se alimentar de forma independente.

Durante esse período, são constantemente monitorados, e seu desenvolvimento é registrado, para garantir que ganhem peso e se fortaleçam.

As aves resgatadas, igualmente frágeis, recebem alimentação especial em forma de papinhas, introduzidas em seus bicos várias vezes ao dia. Essa alimentação requer paciência, pois a equipe ajusta o volume e a frequência conforme as necessidades de cada espécie.

Além de alimentar, os profissionais também trabalham para estimular o retorno do comportamento natural de voo, criando espaços seguros para que possam exercitar as asas até que estejam prontas para voar sozinhas.

Cada filhote é único e exige um tratamento especializado. O trabalho da equipe do CRAS e do Hospital Ayty vai além dos cuidados físicos: inclui a recriação de ambientes enriquecidos que imitam o habitat natural desses animais, ajudando-os a redescobrir comportamentos essenciais para sua sobrevivência. Todo o processo é realizado com paciência, respeito e dedicação, com a meta de devolver esses filhotes à natureza quando estiverem prontos.

No entanto, nem todos os animais têm condições de retornar ao seu habitat. Alguns, por conta de ferimentos graves ou comprometimento de suas habilidades motoras e instintivas, precisam encontrar outros caminhos.

Para esses animais, existem alternativas, como a transferência para instituições de pesquisa ou criadouros conservacionistas. Nessas instituições, mesmo fora do ambiente selvagem, os animais desempenham papéis vitais na preservação de suas espécies, contribuindo para programas de reprodução e estudos sobre biologia e comportamento.

Cada filhote é único e exige um tratamento especializado. Foto: Divulgação/Imasul/CRAS

Órfãos

Atualmente, o CRAS abriga em torno de 250 animais de 20 espécies diferentes, entre eles os chamados "órfãos do fogo", sobreviventes dos incêndios florestais que devastaram a região. Um exemplo comovente foi o resgate de um jovem veado, trazido ao CRAS pelo Ibama no início de agosto, após ser encontrado pelo Prevfogo em Campo Grande.

Sozinho, sem sua mãe, ele agora encontra segurança dos cuidadores do CRAS. Outro caso envolve dois lobinhos, resgatados pela Guarda Municipal e entregues pela PMA, após serem encontrados sozinhos em uma mata em Dourados.

Em meio a esses relatos emocionantes, destacam-se também histórias de superação como a dos gatos-palheiro, resgatados durante o combate a incêndios em Miranda, e a de uma onça-parda debilitada, encontrada em Costa Rica, possivelmente fugindo das queimadas.

Esses animais, agora recebendo cuidados intensivos no CRAS, têm uma nova chance de recuperação e, quem sabe, de retorno à vida selvagem.

Cada vida resgatada no Hospital Ayty é uma vitória, e cada filhote que sobrevive é um símbolo de esperança para a conservação da fauna silvestre. Mesmo aqueles que não podem retornar à natureza encontram novos propósitos em suas vidas, contribuindo para a preservação de suas espécies e garantindo que suas histórias ajudem a manter a biodiversidade.

Diretor-presidente do Imasul, André Borges destaca a complexidade do trabalho. "Cuidar dos filhotes de animais silvestres não é uma tarefa simples. Contamos com uma equipe altamente treinada e dedicada, que diariamente se empenha em oferecer o melhor cuidado a esses pequenos, que são extremamente sensíveis e exigem uma atenção especial. Temos uma boa infraestrutura, que é adequada para garantir o bem-estar desses animais e proporcionar o suporte necessário para sua recuperação e reabilitação".

Além do cuidado físico, a equipe também se preocupa com a saúde emocional desses filhotes. Recintos especiais são montados para minimizar o estresse do cativeiro, com ninhos, esconderijos e outros elementos que ajudam a simular o ambiente natural. Esses detalhes fazem a diferença para que os filhotes não percam seus comportamentos instintivos e, quando for possível, tenham condições de retornar à natureza.

Gestora do CRAS, Aline Duarte ressalta a importância do trabalho realizado. "O trabalho do CRAS e do Hospital Ayty é um lembrete poderoso da importância de cada vida no ciclo da natureza. Ali, no meio da correria dos cuidados, do alimentar de filhotes e das cirurgias delicadas, brota a esperança de que esses pequenos retornem à sua verdadeira casa: a natureza. O mundo animal nos inspira e desafia, motiva a continuar lutando por cada vida que chega em nossas mãos".

Além do cuidado físico, a equipe também se preocupa com a saúde emocional desses filhotes. Foto: Divulgação/Imasul/CRAS

Alimentação

A equipe do hospital, planeja cardápios variados e balanceados, considerando as necessidades nutricionais específicas de cada espécie. O menu é rico em frutas frescas, carnes e outros alimentos naturais, buscando simular ao máximo a dieta dos animais em seus habitats naturais.

Para garantir a qualidade da alimentação, o hospital conta com uma cozinha especialmente equipada. Esse ambiente é paramentado com ferramentas e utensílios adequados para preparar as refeições dos pequenos animais, como aves, filhotes de mamíferos e répteis. Além disso, todos os alimentos passam por um controle rigoroso de higiene e qualidade.

Entre as espécies atendidas estão os tamanduás-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), animais que têm uma dieta altamente especializada. Para garantir a melhor nutrição possível, os tratadores do hospital vão além do preparo básico. Eles buscam cupinzeiros na natureza, fornecendo ao tamanduá um dos principais componentes de sua alimentação natural: cupins e formigas. Esse cuidado não só garante a nutrição ideal, mas também estimula o comportamento natural da espécie, essencial para a reabilitação completa e futura reintegração ao habitat.

"Nosso objetivo é não só garantir que os animais recebam os nutrientes necessários para a recuperação, mas também proporcionar uma dieta que se aproxime ao máximo da alimentação que teriam na natureza", explica Fernanda Mayer. O cuidado com a alimentação é parte essencial do processo de reabilitação, contribuindo para a saúde física e bem-estar dos animais, que posteriormente poderão ser reintegrados ao seu ambiente natural.

Ambientes

O hospital não se destaca apenas pela excelência nos cuidados médicos e nutricionais dos animais, mas também pela adaptação dos ambientes conforme as necessidades de cada espécie. Os espaços são cuidadosamente projetados para promover conforto, estimular comportamentos naturais e facilitar a reabilitação, aumentando as chances de uma futura reintegração à natureza.

Alguns deles estão bem no inicio da vida, em período de saúde frágil. Foto: Divulgação/Imasul/CRAS

No recinto das aves, por exemplo, galhos naturais são incorporados ao ambiente, simulando árvores para que os pássaros possam pousar e se movimentar como fariam em seu habitat. Para os primatas, são instaladas cordas que imitam cipós, permitindo que os animais se locomovam de forma semelhante à que utilizariam em florestas.

Já as onças-pintadas e pardas, espécies que precisam de esconderijos e espaços para se camuflar, são acomodadas em recintos que possuem tocas, permitindo que elas mantenham seu comportamento natural.

Além disso, espécies de grande porte recebem atenção especial. Aves maiores, como as araras, têm à disposição viveiros amplos, que proporcionam a oportunidade de realizar voos mais longos e manter a musculatura ativa. Já a anta (Tapirus terrestris), o maior mamífero da fauna brasileira, desfruta de um espaço extenso com árvores e um lago, garantindo que o animal possa nadar e se refrescar, algo essencial para o seu bem-estar e recuperação.

A personalização dos recintos visa não apenas o conforto dos animais, mas também a recriação dos estímulos físicos e mentais que enfrentariam na vida selvagem.

"Cada espécie tem suas particularidades, e o ambiente onde ficam durante a reabilitação precisa refletir isso. Os animais precisam estar preparados para retornar ao seu habitat com comportamentos adequados e uma condição física compatível com a vida na natureza", explica Allyson Favero, um dos biólogos responsáveis.

Infraestrutura

Os filhotes contam com uma das mais modernas estruturas de atendimento à fauna no Brasil, que inclui equipe plantonista, farmácia, almoxarifado e salas de controle e raio-X. A área cirúrgica é totalmente equipada para procedimentos avançados, com esterilização, antissepsia, preparação de pacientes, cirurgia e pós-operatório.

O hospital possui cinco salas de triagem e áreas de quarentena para aves, répteis e mamíferos, todas com solário e espaço ao ar livre, além de áreas de isolamento para controle de doenças e uma sala de armazenamento de amostras para pesquisas e diagnósticos.

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