O Conselho de Lideranças do Povo Guató no Pantanal de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul emitiram uma nota pública nesta terça-feira, 21 de janeiro, denunciando a falta de assistência médica adequada a população indígena das aldeias no Pantanal.
De acordo com a nota, há décadas os povos originários do Pantanal lutam pela invisibilidade étnica e pela imposição do rótulo de ribeirinhos. Lideranças ressaltam que "a classificação de várias comunidades do povo Guató como “ribeirinhas” tem sido feita com apoio de ONGs (Organizações Não Governamentais), representantes das elites econômicas e políticas locais, pesquisadores, agentes públicos e órgãos do Estado Brasileiro", Eles destacam ainda, que sendo “ribeirinhas”, as comunidades indígenas "perdem seus direitos originários sobre as terras tradicionalmente ocupadas, e deixam de receber assistência por parte da FUNAI (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e da SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena)".
Com a etnia irreconhecida, os povos perdem tratamento adequado junto ao MPF (Ministério Público Federal) para garantir seus direitos de povos originários. "Isso tem ocorrido porque as comunidades do povo Guató estão estabelecidas em lugares distantes dos centros urbanos, onde o principal meio de transporte são as canoas de um pau só e embarcações a motor. No Pantanal profundo, a ausência eficaz e moralizadora do Estado Brasileiro aumenta a vulnerabilidade social e favorece a perpetuação de várias formas de violência contra nossas comunidades, inclusive para a transformação de terras indígenas não regularizadas em propriedades privadas e unidades de conservação.", diz a nota.
Além da luta pelo reconhecimento étnico, o povo guató denuncia a falta de assistência médica nas aldeias. De acordo com o documento, as Aldeias Aterradinho e São Benedito, em Barão de Melgaço, e as Aldeias Uberaba e Barra do São Lourenço, em Corumbá, enfrentam sereros problemas respiratórios causados pelos incêndios florestais de 2024. Crianças e idosos enfrentam problemas de saúde sem atendimento médico. O Conselho pede por um posicionamento por parte da SESAI, mais precisamente dos DSEIs (Distritos Sanitários Indígenas) de Cuiabá e Mato Grosso do Sul para solucionar a questão.
Na nota, o Conselho de Lideranças do Povo Guató no Pantanal de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul detalharam as necessidades e dificuldades das aldeias.
"As comunidades estabelecidas em terras demarcadas, como as TIs Guató e Baía dos Guató, recebem atendimento por parte da SESAI. Na Aldeia Uberaba, porém, o atendimento precisa ser aprimorado com a contratação de Agentes Indígenas de Saneamento e a expansão do sistema de abastecimento de água tratada para atender a todas as famílias. Lá também se faz necessária a manutenção periódica e preventiva do gerador que serve para bombear água tratada até as casas. Na cidade de Corumbá, para onde periodicamente se deslocam várias pessoas das Aldeias Uberaba e Barra do São Lourenço, em busca de atendimento médico e da realização de exames e cirurgias, há a necessidade de um lugar para o acolhimento temporário dos pacientes indígenas."
"Nas Aldeias Aterradinho e São Benedito, por seu turno, bastante distantes entre si, há a necessidade de cada uma delas contar com Agente Indígena de Saúde, Agente Indígena de Saneamento e Técnico de Enfermagem, bem como de unidade de saúde e da implantação do sistema de abastecimento de água tratada. Cada uma das duas aldeias também precisa de um barco a motor para os profissionais de saúde se deslocarem até as famílias estabelecidas ao longo das margens dos rios Cuiabá e Perigara, e do Corixo do Bebe. Contando com barco a motor e uma cota mensal de combustível, será mais fácil o atendimento de pessoas com comorbidades e, quando necessário, sobretudo nas cheias, levá-las pelo rio Cuiabá até a estrada que chega a Poconé, cidade onde também precisamos ter um espaço para o acolhimento dos pacientes indígenas".
Apontada como a comunidade em situação mais grave e preocupante, a Barra do São Lourenço, segundo a nota, não recebeu nenhuma visita do Polo de Corumbá do DSEI-MS durante o ano de 2024. "Repetidas vezes membros do nosso Conselho buscaram conversar sobre o problema com o Sr. Lindomar Ferreira, Coordenador do DSEI-MS, mas até agora nenhuma solução foi apresentada formalmente às lideranças da aldeia ou a este Conselho".
Ainda de acordo com a nota, em fins do ano passado, receberam a informação de a SESAI não teria enviado uma equipe à Aldeia Barra do São Lourenço porque o nível do rio Paraguai estaria muito baixo para uma viagem de barco até a localidade. Porém, segundo as lideranças, grandes barcos de turismo e embarcações das Forças Armadas conseguiram navegar pela região. "Em janeiro de 2025, uma de nossas lideranças encontrou uma equipe da SESAI subindo de barco pelo rio Paraguai. Na ocasião, inquiriu o coordenador do Polo de Corumbá sobre o atendimento à Aldeia Barra do São Lourenço e ele respondeu que seria preciso conversar sobre o assunto, pois o órgão não disporia de infraestrutura para atender as pessoas da aldeia. Uma pessoa ali presente disse para a liderança buscar ajuda com o Programa Povo das Águas, da Prefeitura Municipal de Corumbá. Este tipo de postura se soma a um conjunto de discriminações de que temos sido vítimas no Pantanal, cujas ações denotam ou desconhecimento sobre o papel da SESAI ou preconceito etnicorracial ou as duas coisas juntas".
Por fim, a nota assinada por Carlos Henrique Alves de Arruda (Cacique Aldeia Aterradinho), Dalvina Moraes de Amorim (Cacica da Aldeia São Benedito), Denir Marques da Silva (Cacique da Aldeia Barra do São Lourenço) e Osvaldo Correia da Costa (Cacique da Aldeia Uberaba), conclamam os "coordenadores dos Distritos Sanitários Indígenas de Cuiabá e de Mato Grosso do Sul, bem como as Coordenações Regionais da FUNAI e o MPF nos dois estados para que envidem os esforços necessários para que as comunidades do povo Guató não permaneçam abandonadas no Pantanal profundo e sem um atendimento de excelência no que diz respeito à saúde. A SESAI, portanto, deve incluir todas as nossas comunidades em suas ações no Pantanal, cumprindo e fazendo cumprir as competências expressas no Art. 46 do Decreto n. 11.798, de 28 de Novembro de 2023".
Receba as notícias no seu Whatsapp. Clique aqui para seguir o Canal do Capital do Pantanal.