A água do Rio está visivelmente alterada pelo despejo de esgoto misturado com cal. Foto: Capital do PantanalHá aproximadamente um mês a reportagem do Capital do Pantanal foi acionada por pescadores, turistas e empresários do turismo em Corumbá para ver dois esgotos que desembocam no Rio Paraguai, onde era atracadouro de embarcações. Na área de entorno da orla portuária, quem desce pela rua Domingos Sahib, vindo pela ladeira José Bonifácio, já sente o mau cheiro e percebe, imediatamente, a mudança na vegetação do Rio, hoje visivelmente assoreado e tomado por erva de bicho. Não precisa ser especialista para perceber que tem algo errado no local. Trata-se do primeiro sintoma da poluição que vai transformar o local no segundo maior desastre ambiental do Pantanal, depois do assoreamento do Rio Taquari. O processo de eutrofização já está em estado avançado, cujas consequências são a mortalidade de peixes, assoreamento pelo acúmulo de resíduos, modificações na vegetação aquática, escassez de vegetação típica (camalote), provocados pelo descarte irregular de resíduos sólidos, uma vez que é possível identificar a quantidade de carga química no resíduo liberado pelas galerias, no Rio Paraguai.
DBO
O Capital do Pantanal colheu amostra da água e encaminhou para análise num laboratório em Campo Grande. O resultado chegou dia 17 de Abril, e confirmou que o nível de oxigênio na água está alterado, mais que o dobro do permitido, o que já confirma a poluição daquelas águas. "O teste de DBO é um bioensaio, procedimento no qual o resíduo é biologicamente oxidado sob condições controladas a fim de se estabelecer o consumo de oxigênio e, consequentemente, estimar, aproximadamente, a quantidade de matéria orgânica biodegradável presente em uma amostra de água" (GASTALDINI e MENDONÇA, 2001). Pode-se afirmar que nos locais onde o valor de DBO for alto, provavelmente os valores de oxigênio dissolvidos serão baixos e a concentração de matéria orgânica será alta. Neste caso, o meio pode tornar-se anóxico, limitando a vida aquática. Os maiores aumentos em termos de DBOS num corpo d'água são provocados por despejos de origem predominantemente orgânica. Em Corumbá, duas galerias desembocam nas águas do Rio Paraguai. Acredita-se que uma seja de águas pluviais e a outra proveniente de uma estação de tratamento de esgoto, que libera os resíduos sem tratamento no Rio, após o tratamento da água que é distribuída na cidade.
Denúncia
Luceni, empresária do ramo do turismo, precisou remover um barco restaurando do local por conta do acúmulo de vegetação alterada. Foto: Capital do PantanalSegundo a empresária Luceni Aparecida Alvez a situação está tomando proporções avassaladoras, “trabalho com barcos e passeios ecológicos e essa situação é terrível. Não temos mais onde atracar as embarcações, vamos perder o acesso porque a terra que se acumulou e a vegetação alterada, mudou tudo. Não é mais a mesma. Eu tinha um barco restaurante neste lugar e tive que retirar daqui, porque desde 2006 o problema se agravou e ninguém toma providencias” .
O pescado Paulo lamenta o descaso dos órgãos ambientais. Foto: Capital do PantanalSegundo o pescador Paulo da Conceição Vasconcelos, conhecido como Paulo Jatobá, ele encostava a lancha nesse atracadouro, “agora tem essa galeria entupida com água de várias cores inclusive com cal. Eu pergunto como vai ficar essa sujeira. Olha as caixas de lanchas e os padrões de energia inúteis porque os barcos não podem mais encostar. Nós chamamos a Polícia Ambiental no dia que estava morrendo peixes, mas eles não conseguiram entrar com a embarcação. O Ibama veio tirou fotos e disse que não é de sua responsabilidade. É triste ver tudo isso devastado desta forma e ninguém faz nada”. O Capital do Pantanal descobriu que o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico Nacional) já notificou a Prefeitura de Corumbá e a Sanesul sobre o assunto, porque no início do ano o esgoto que passa pela escadinha da Rua XV de Novembro estourou, rolando pedras das encostas, e ocasionando a interdição da escadinha, devido ao perigo de novos deslizamentos. Até o momento ninguém teria se manifestado. O esgoto continua estourado e jorrando água suja em área de preservação. Em contato com a secretaria de Meio Ambiente do Município fomos informados por uma funcionária que a titular da pasta não falaria porque ainda estava se informando sobre o assunto. O Imasul na capital também disse desconhecer o fato, bem como a Sanesul que até o fechamento da matéria não se pronunciou.
Paulo mostra que caixas de lanchas e padrões de energia estão inutilizadas, já que as embarcações não conseguem encostar na margem do Rio. Foto: Capital do Pantanal
Gravidade
O biólogo Ademir Kleber M. de Oliveira, mestrado e doutorado em Ecologia e Conservação dos Recursos Naturais, professor titular da Uniderp em Campo Grande, disse ao Capital do Pantanal, que pelo que pode observar através das filmagens, “estão despejando dejetos de tratamento de esgoto, sedimentos, que estão se acumulando e bastante, nas margens do Rio Paraguai. Esse acúmulo de matéria orgânica está propiciando o crescimento de uma vegetação de beira de Rio, essa vegetação toma totalmente conta daquela área, que com o tempo se produziu um assoreamento daquela região, que se tornou rasa e consequentemente o Rio foi impedido de chegar. É uma coisa totalmente inadequada, você não pode despejar resíduos de tratamento de esgoto nas margens de um Rio ou na água, porque com o tempo a área fica muito rasa e a vegetação aquática, como a erva de bicho visível ali, toma conta”.
Dr. Ademir, biólogo professor titular da Uniderp de Campo Grande, classifica o caso como preocupante. Foto: Capital do PantanalDesastre
Para o pesquisador há uma sequência de erros visíveis, “o primeiro erro, bem claro, é a disposição inadequada desses resíduos, eles deveriam ser despejados em áreas apropriadas. Resíduos de tratamento de esgoto, aquele lodo, é composto por uma série de produtos químicos, além da matéria orgânica, tudo que foi usado para tratar o esgoto também está nesse resíduo. O que tem nesse resíduo? Não sei, podem ter metais pesados, produtos tóxicos. Pode ter qualquer coisa porque é esgoto, e isso despejado no Rio, aos poucos se espalha pela água, se diluindo e vai contaminando toda essa área do Rio Paraguai. Se você fizer uma análise química ela será básica, vai identificar que nessa água tem uma alta demanda bioquímica de oxigênio, talvez tenha coliformes fecais, você vai ter uma turgidez. Fazem-se os testes básicos, mas o problema é mais sério, porque para saber o que realmente acontece tem que ser mais profunda, tem que fazer uma análise química e ver que tipo de resíduo existe, e é claro que esse tipo de análise é muito mais cara e não é em qualquer lugar que vai fazer”. Segundo biólogo, as empresas tentam mascarar o visual da situação utilizando calcário para combater a acidez, "tornando o ambiente menos ácido, mas mesmo assim está ocorrendo morte de peixe, o que significa presença de produtos tóxicos".
Análise
A água analisada apresentou presença de ferro, mas o grave foi a taxa de DBO acima do permitido o que significa que o Rio já está poluído nesta área e apresenta o processo de eutrofização, o fenômeno no qual o ambiente aquático caracteriza-se por uma elevada quantidade de nutrientes – principalmente Denominamos e fosfatos. Este fenômeno é resultante da poluição das águas por ejeção de adubos, fertilizantes, detergentes e esgoto doméstico sem tratamento prévio que provocam o aumento de minerais e, consequentemente, a proliferação de algas microscópicas que localizam-se na superfície.
Confira a análise da água do Rio realizada por laboratório de Campo Grande. Foto: Reprodução do documento de análise química
Desse modo, cria-se uma camada espessa de algas que impossibilitam à entrada de luz na água e impedem a realização da fotossíntese pelos organismos presentes nas camadas mais profundas, o que ocasiona a morte das algas, a proliferação de bactérias decompositoras e o aumento do consumo de oxigênio por estes organismos. Consequentemente começa a faltar oxigênio na água o que gera a mortandade dos peixes e outros organismos aeróbicos.
Na ausência do oxigênio, a decomposição orgânica torna-se anaeróbica produzindo gases tóxicos, como sulfúrico (que causa o cheiro forte característico do fenômeno). A eutrofização causa a destruição da fauna e da flora de muitos ecossistemas aquáticos, transformando-os em esgotos a céu aberto. Esse cenário permite a proliferação de inúmeras doenças causadas por bactérias, vírus e vermes.
Pesquisas
Em 2013 sites especializados em meio ambiente divulgaram uma pesquisa na qual avaliaram a água dos Rios do Brasil. Foi constatado que 11% dos Rios brasileiros analisados são considerados de boa qualidade, enquanto 35% receberam a classificação de “ruins” e 5% estavam em situação crítica. O restante, 49%, é considerado pela organização como regular.
Os piores índices encontrados pelo estudo se localizam nos centros urbanos. Falta de tratamento de esgoto, lançamento ilegal de efluentes industriais e desmatamento, são as principais fontes de contaminação e poluição dos recursos hídricos.
Os melhores índices, por sua vez, estão em áreas protegidas pela lei, como a bacia do Alto Tietê, na Área de Proteção Ambiental (APA) Capivari-Monos, em São Paulo; em Extrema (MG), na APA Fernão Dias e no Espírito Santo, no município de Santa Teresa, conhecido como Santuário Capixaba da Mata Atlântica. O levantamento foi realizado em 177 pontos de 96 Rios em sete Estados brasileiros.
Vídeo enviado por internauta no último domingo (23), mostra o lançamento de esgoto na água do Rio Paraguai.
De onde vem a poluição?
Convenções internacionais estabelecem que qualquer tipo de material ou substância que interfira no equilíbrio de um determinado ecossistema é considerado um poluente. Neste sentido, a degradação dos nossos rios possui várias causas, inclusive o comportamento inadequado ou conivente da população ao fazerem o descarte de seus resíduos de forma irregular ou não cobrarem de empresas e governos uma postura mais sustentável.
No caso das águas, os principais e mais comuns poluentes são esgoto doméstico, petróleo e seus derivados, metais pesados, substâncias organocloradas (poluentes orgânicos persistentes) e o lixo. Veja abaixo como cada um dos fatores impacta na sociedade e como você pode fazer para diminuir o dano ao recurso natural mais precioso do planeta:
Esgoto doméstico
Com o lançamento do esgoto ou efluente doméstico não tratado nos rios, há um aumento da matéria orgânica na água, o que faz com que o equilíbrio local seja afetado, ocorrendo o aumento de determinados microrganismos e a dificuldade de desenvolvimento de outros. Esse processo, conhecido como eutrofização, pode levar ao surgimento de microalgas e ao sufocamento de peixes e outras espécies, além da transmissão de doenças presentes nas fezes humanas para outros consumidores da água. Sem citar o fato de que o esgoto doméstico pode estar contaminado com substâncias tóxicas não orgânicas.
Neste caso, é preciso conhecer bem qual a destinação correta para cada tipo de esgoto produzido pela residência/indústria, além de procurar se informar sobre a existência ou não de Estações de Tratamento de Esgoto (ETE) na região e sua eficiência.
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